sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

CINEMA PARADISO #11: CLOSER

 
"... eu sou um observador clínico

... do circo humano."


Por mais que eu as procure, não encontrarei melhores palavras para definir a experiência absolutamente perturbadora que é assistir Closer - Perto Demais (2004). A frase dita por Larry (Clive Owen), enquanto degustava, despretensiosamente, um aperitivo qualquer, retrata, com perfeição, a posição em que o espectador se sente ao longo de todo o filme. E mais do que isso, certo é que, por muitas vezes, torna-se possível se enxergar como parte integrante daquele circo.

Escrito por Patrick Marber e dirigido - brilhantemente - pelo veterano cineasta Mike Nichols (A Primeira Noite De Um Homem), o filme gira em torno das reviravoltas na vida de dois casais, Dan (Jude Law), Alice (Natalie Portman), Anna (Julia Roberts) e o já citado Larry, pessoas estas, cujo o acaso acabou por unir. E, neste sentido, vale dizer que o cartão-de-visitas do diretor já nos é entregue na maravilhosa cena de abertura do longa, na qual somos apresentados à sofrida e bela canção Blower´s Daughter, de Damien Rice.


Sobre esta cena, confesso, era a intenção inicial desta postagem apenas mostrá-la e enumerar os muitos pontos que a fazem tão singular e tocante. Ao revê-la dezenas de vezes nos últimos dias, me senti compelido à rever o filme todo, o que me levou a mudar de idéia e ampliar o comentário, merecidamente, para todo o longa. 

Dito isto, não há como deixar de apreciar a beleza da abertura. Desde o instante em que a música começa, e  somos forçados à ver o letreiro indicando o nome do filme a partir de uma distância agressivamente próxima, Nichols denuncia saber o poder do material que tem em mãos. Plenamente consciente do magnetismo exercido por Natalie Portman e seu cabelo vermelho, o diretor sabe que nada mais precisará fazer, exceto deixar que Jude Law caminhe, lentamente, na direção da garota. A partir disso, o que se vê é o prenúncio da brilhante atuação que o par irá nos entregar no restante do filme. Observe, por exemplo, o esboço de sorriso que surge nos lábios de Alice e que é - prontamente - respondido por Dan com um olhar de espanto, como se dissesse: "será que ela está olhando para mim?" - E, ao receber como tréplica o  lindo sorriso da garota, Dan não consegue conter a vaidosa satisfação que este lhe causa, criando um momento particularmente belo de tímida felicidade no instante em que abaixa o seu olhar.

O nível de sintonia entre os dois (atores ou personagens, não sei) é tão grande, que Alice, ao reabrir os olhos após ser atropelada e pronunciar as palavras que servirão, eternamente, como marca registrada do filme, "hello stranger!", faz com que Dan, agora sim, deixe escapar um sorriso maior e mais pretensioso, nitidamente sabedor de que, daquele ponto em diante, sua vida nunca mais será a mesma. Ouso dizer, nem as nossas, pois, ao ver tudo isso acontecer em apenas dois minutos de projeção, penso ser impossível não se emocionar e se encantar diante das grandiosas perspectivas daquilo que iremos testemunhar na sequência.

O circo humano de Closer é constituído por quatro integrantes que têm, em comum, uma mesma arma: as palavras. Logo, muito mais importante do que se preocupar em inventivas trucagens de direção, Mike Nichols apenas liga sua câmera, aproxima sua lente, e deixa que seus personagens lancem suas bombas verbais. E, nesse aspecto, o que torna os diálogos ainda mais interessantes, é a consciência que os personagens possuem do poder de suas palavras, fazendo com que todas as cenas do longa assumam um caráter importantíssimo e ajudem o espectador a montar o estereótipo de cada um dos quatro. O que, especificamente neste filme, não levará a nenhuma conclusão.

 
 "Qual seria o meu eufemismo?"
 "Ela era desconcertante..."
"Isso não é eufemismo."
 
 "É sim!"

Porém, muito mais importante do que simplesmente analisar e entender o universo daqueles quatro personagens, suas fraquezas, suas motivações, suas inseguranças e suas frases de efeito, deve-se perceber que Closer, dolorosamente, funciona como espelho do mundo ávido e cruel em que vivemos, refletindo a nós mesmos. Mundo este, em que a verdade não encontra espaço, cedeu seu lugar para uma sucessão de mentiras em cadeia que, depois de proferidas repetidamente por muito tempo, tornaram-se as verdades daqueles indivíduos.

E, para ilustrar isso de maneira brilhante, Nichols fecha o filme, usando uma metáfora visual belíssima, nos levando de volta a um determinado parque por onde dois personagens tinham passado no começo do longa. Ao rever o filme, é possível notar que, ainda na cena inicial, prositalmente, o inteligente diretor afasta sua câmera no momento em que os personagens vão entrar no local. Simultaneamente, uma dolorida trilha sonora os acompanha, como se enunciasse que a verdade posteriormente descoberta ali, seria capaz de causar enorme dor a quem a recebesse.


Evidenciando, ainda mais, sua intenção de criar um universo comandado por falsos valores, durante todo o filme uma única comprovada verdade é desnudada. E utilizo este  termo, pelo fato de, mais uma vez de forma brilhante, o diretor esbanjar sensibilidade ao, simultaneamente, exibir a estonteante beleza de Natalie Portman e pronunciar a aguardada revelação. Porém, ainda mais triste é a recepção que esta revelação tem, nos fazendo concluir que, em um mundo dominado por amizades de mentira, relacionamentos de mentira e vidas de mentira, uma única verdade torna-se descartável.

"Eu quero que me diga seu nome verdadeiro!"
 "Meu nome verdadeiro é Jane." 


CLOSER - PERTO DEMAIS (Closer, 2004) -
OSS!


3 comentários:

  1. Oi Danilo, excelente escolha!
    Esse filme é perfeito. É humanamente dolorido. É visceral!
    E tem uma peculiaridade que me fascina sobremaneira, as lacunas temporais do filme, e o jogo de "insinuações" proposto pelos personagens, nos permite viajar sem limites... Somos reféns apenas e tão somente da nossa imaginação!
    Os diálogos, que são pra mim o ponto forte do filme, são intensamente agressivos, na exata medida do contexto das relações interpessoais.
    Adorei o texto, a crítica, e a sua visão acerca dessa obra prima do cinema!
    Parabéns!

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  2. Vi a uns dois meses atras este filme.Fiquei com a consciencia pesada, perguntando-me porque nao tinha visto o filme antes!Fiquei um fã e apaixonado por a Natalie Portman desde aí.
    é mto bom o filme.Muito, muitissimo.

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  3. Miguel, é um filme que nos deixa com a consciência pesada de qualquer maneira, hahaha. Por não ter visto ou após vê-lo. Abraço.

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