Mais uma vez vou me arriscar a falar do que não entendo muito. Neste caso, porém, a culpa não é minha. A maioria das pessoas da minha geração foi desestimulada no que se refere à hábitos de leitura. No meu caso, o problema começou, aproximadamente, aos 11 anos de idade, quando a escola me forçou a ler Vidas Secas, Memórias Póstumas de Brás Cubas e Dom Casmurro. Este último, por sinal, não satisfeita em apenas exigir a leitura, a professora ainda pediu que fizéssemos um teatro, onde deveríamos responder a grande questão da obra: Capitu era ou não uma traidora? Meu Deus! De fato, não há como negar, são obras espetaculares, mas não para recém-nascidos.
Este atentado cometido pelo(s) colégio(s), fez com que eu cultivasse uma fobia por livros, de forma que são facilmente contados os que li durante minha vida. Acabei por me enveredar no universo dos filmes, fazendo com que os livros ficassem ainda mais em segundo plano, ou terceiro. Não me orgulho nem um pouco disso, acreditem.
Felizmente, nem tudo foi perdido, creio eu. Tenho algumas cartinhas escondidas nas mangas (curtas, rs). Uma delas, é o belo e sensível poema de Guilherme de Almeida - A Rua das Rimas. Lembro-me de, ainda adolescente, já ter memorizado o poema completamente, de tanto que me agradava a sua leitura. Hoje, relendo-o, a impressão não se alterou. Continuo a invejar a Rua esculpida, de forma primorosa, por Guilherme de Almeida.
Na verdade, eu desejo a Rua. E penso não haver melhor maneira de dizer o quanto gosto do poema do que esta. Ele desperta o meu pensamento, fazendo com que minha cabeça começe a desenhar, passo a passo, cada detalhe enumerado pelo poeta. Ao terminar de ler, minha vontade é de morar, para sempre, neste lugar mágico que foi criado. Apreciar o piano provinciano ou a serenata de violões, encontrar a si mesmo no intenso, imenso e denso silêncio, quebrado apenas pelo som das crianças, o som da paz.
Interpretar qualquer coisa é muito difícil, poemas, creio eu, são ainda mais subjetivos. A própria maneira com que são concebidos induzem a múltiplas interpretações. Esta é a intenção. Mas, nesse caso, quero guardar para sempre a maneira com que enxergo a Rua das Rimas, certamente, o endereço onde se encontra a Felicidade.
A RUA DAS RIMAS
A rua que eu imagino, desde menino, para o meu destino pequenino
é uma rua de poeta, reta, quieta, discreta,
direita, estreita, bem feita, perfeita,
com pregões matinais de jornais, aventais nos portais, animais e varais nos quintais;
e acácias paralelas, todas elas belas, singelas, amarelas,
douradas, descabeladas, debruçadas como namoradas para as calçadas;
e um passo, de espaço a espaço, no mormaço de aço laço e basso;
e algum piano provinciano, quotidiano, desumano,
mas brando e brando, soltando, de vez em quando,
na luz rara de opala de uma sala uma escala clara que embala;
e, no ar de uma tarde que arde, o alarde das crianças do arrabalde;
e de noite, no ócio capadócio,
junto aos lampiões espiões, os bordões dos violões;
e a serenata ao luar de prata (Mulata ingrata que me mata...);
e depois o silêncio, o denso, o intenso, o imenso silêncio...
A rua que eu imagino, desde menino, para o meu destino pequenino
é uma rua qualquer onde desfolha um malmequer uma mulher que bem me quer
é uma rua, como todas as ruas, com suas duas calças nuas,
correndo paralelamente, como a sorte indiferente de toda gente, para a frente,
para o infinito; mas uma rua que tem escrito um nome bonito, bendito, que sempre repito
e que rima com mocidade, liberdade, tranqüilidade: RUA DA FELICIDADE...
Guilherme de Almeida
OSS!
é uma rua, como todas as ruas, com suas duas calças nuas, - Há um erro neste verso, não são calças e sim calçadas, eis que rua não tem calças, rsrsrs...
ResponderExcluiré uma rua, como todas as ruas, com suas duas calças nuas, - Há um erro neste verso, não são calças e sim calçadas, eis que rua não tem calças, rsrsrs...
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