quinta-feira, 18 de novembro de 2010

CINEMA PARADISO #7: TEMPOS MODERNOS (1936)

Ontem, pela primeira vez na minha vida, assisti à um filme-mudo. O escolhido, como não poderia deixar de ser, foi a obra-prima de Charles Chaplin, Tempos Modernos. Tenho, costumeiramente, esse hábito: sempre que vou buscar conhecer algo novo, tendo a ir direto ao melhor exemplar daquilo em questão. Nem sempre isso é uma boa idéia. Por exemplo, ao querer me familiarizar com o cinema de Fellini, assisti, de cara, Fellini 8 e 1/2. E mesmo sendo incapaz de negar toda a genialidade da obra, sinto não ter feito uma boa escolha, visto que nunca mais quis ver outro filme do diretor, ao menos por enquanto.

Felizmente, o mesmo não ocorreu e nem ocorrerá com Charles Chaplin. Ao fazer delicada escolha, não apenas me surpreendi com o que vi, bem como certo estou de que irei querer buscar, mais a fundo, o conhecimento sobre o cinema de Chaplin.

Falando agora sobre o filme, trata-se de uma crítica feroz à sociedade norte-americana e o seu modelo de trabalho no período seguinte à Grande Depressão de 1929. Chaplin escreve, dirige e atua mostrando igual maestria em todas as funções. Extremamente expressivo, facial e corporalmente, ele, de fato, não precisa de diálogos para se fazer entender. Seu modo de caminhar, seus trejeitos e seus tiques, imitados futuramente à exaustão por outros artistas talentosíssimos, como, por exemplo, Woody Allen e Mr. Bean, nos fazem compreender, com exatidão, o recado que está querendo ser passado. Chaplin opta, acertadamente, por pontuar a narrativa com frases curtas que colaboram, ainda mais, no processo de compreensão e acompanhamento da obra.

No longa, ele protagoniza um sujeito que não se adapta a nenhuma função que lhe é oferecida. Justamente por sentir que, trabalhando daquela maneira, seguindo o modelo de produção em massa idealizado por Henry Ford, ele estaria cometendo um atentado contra si mesmo, deixando de lado todo o seu potencial real, apenas para tornar-se uma peça, insignificante, de uma engrenagem que nunca para de funcionar. O que nos leva à bela metáfora visual (claro, é cinema-mudo) da cena em que ele, literalmente, transforma-se em parte do maquinário da empresa em que trabalha.

Pulando de trabalho em trabalho, sendo preso e solto o tempo todo, e envolvendo-se em diversas cunfusões com seu par romântico, Chaplin não desiste de correr atrás do sonho de ter uma casa e constituir família com sua amada. Qualquer semelhança ao "sonho americano" não é apenas coincidência. E, tal qual na vida real, ele descobre, verdadeiramente, sua vocação por acidente. Sendo praticamente jogado em um trabalho onde teria que entreter uma platéia, Chaplin vê fluir tudo aquilo que guardara por toda a vida: sua arte. A naturalidade que esbanja e a evidente felicidade demonstrada, deixa claro que naquele momento, finalmente, os verdadeiros talentos daquele ser-humano estavam sendo descobertos, e não mais ocultados por um sistema de produção burro.


Vale constatar que era a primeira vez em que Charles Chaplin mostrava a sua voz em um filme. E para tornar isso ainda mais incrível e marcante, ele o faz de maneira extremamente simbólica, soltando palavras a esmo, em nenhum idioma. O mais incrível é que conseguimos rir e nos divertir com aquilo que está sendo dito, como se estivéssemos compreendendo, de fato, aquelas palavras. Tal coisa é concebível apenas na cabeça de gênios mesmo.

Mesmo sem nos mostrar um final feliz nos moldes que estamos habituados, Tempos Modernos ainda consegue, brilhantemente, comover em sua cena final. Sendo obrigado, mais uma vez, a abandonar sua casa para poder continuar junto de sua amada, ambos dirigem-se, lado-a-lado, à uma estrada, reta, horizontal, maravilhosamente fotografada em preto-e-branco, na qual, antes de seguir jornada, Chaplin aproxima-se da câmera junto à sua mulher, pedindo-lhe que sorria. Um momento sensível e tocante que nos mostra todo o amor pela vida que aquele sujeito tem, nos fazendo repensar nossas próprias vidas e nossos muitos potenciais escondidos.




OSS!

3 comentários:

  1. A música Smile,composta por ele mesmo,foi considerada uma das mais lindas do mundo.

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  2. Como lhe disse há pouco, pra mim "Tempos Modernos" é referência na minha lista pessoal de filmes clássicos maravilhosos e emocionantes.

    E já ao contrário de você, considero o final de um otimismo sem igual. À mim passa a nítida impressão de que a felicidade pra ele é estar ao lado da pessoa que ama, e que independente do que nos obriga o sistema, temos sempre a opção de continuar a nossa busca por essa felicidade.

    E belo texto velhão... não só mais uma bela escolha como mais uma bela análise desta.

    OSS!

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  3. Tb considero o final otimista Thiagão, por esses mesmos motivos citados por vc. Só salientei que, em uma análise superficial, não se trata do típico final feliz Hollywoodyano. Mais um ponto pro filme.

    E tia, não sabia desse detalhe... obrigado. Beijos.

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